FUNDAÇÃO SARNEY GANHA R$ 1,34 MI DE ESTATAL
Folha de S. Paulo – 9.7.09
A Fundação José Sarney em São Luís (MA), que recebeu R$ 1,34 milhão da Petrobras entre o fim de 2005 e setembro passado para preservação de seu acervo, tem como principal atração para o público, em vez de livros e o museu, uma festa julina idealizada pela governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB).
Os festejos, que começaram na semana passada e vão até o fim do mês, são realizados pela Associação dos Amigos do Bom Menino das Mercês, comandada por Raimundo Nonato Quintiliano Pereira Filho, funcionário do gabinete do senador Lobão Filho (PMDB-MA). Lobão é aliado do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o criador da fundação. O dinheiro da Petrobras, segundo a estatal, foi destinado à preservação do acervo da biblioteca e do museu. Entre as peças em exposição, há cartazes de campanha, caricaturas e quadros de Sarney.
Numa quinta-feira, a Folha foi ao prédio da fundação, localizado no centro histórico de São Luís. O repórter recebeu a informação de que a biblioteca estava fechada e sem previsão de funcionamento.
A reportagem procurou o diretor da entidade Fernando Belfort, ex-funcionário do Senado e hoje no governo de Roseana. Ele então mostrou a biblioteca e o museu à Folha. Belfort disse que a entidade vive do dinheiro do aluguel de um salão para reuniões ao custo de R$ 1.000 por dia. Afirmou que a Vale Festejar, idealizada por Roseana e patrocinada pela Vale, é a principal atração.
A biblioteca, porém, não tem estrutura para atendimento ao público, conforme a Folha constatou. Funcionários não conseguiram localizar os exemplares da primeira edição de \"Espumas Flutuantes\", de Castro Alves, de \"O Francesismo\", de Eça de Queiroz, nem \"uma obra rara de [Nicolau] Maquiavel [1469-1527] datada de 1560\", joias que a Fundação informa ter em seu acervo.
Belfort exibiu duas salas vazias onde, segundo ele, funcionam laboratórios de recuperação de livros raros.
As instalações teriam sido feitas com verba da Petrobras. Há ainda divergências de números sobre o acervo. A fundação informa que há 40 mil documentos. A Petrobras diz que são 50 mil. A sede da fundação é um prédio histórico erguido no século 17, onde funcionou o convento das Mercês. Durante a festa, o local recebe barracas de festa junina. Na abertura, um grupo cantou uma toada em homenagem à governadora: \"Ela é mulher no Senado, ela mulher do governo e também do nosso Estado. [...] E viva Roseana\".
SENADOR DIZ QUE RECURSOS FORAM BEM APLICADOS
Folha de S. Paulo – 9.7.09
O senador José Sarney (PMDB-AP) disse ontem, via assessoria, que os recursos da Petrobras foram aplicados corretamente pela fundação que leva o seu nome.
A assessoria enviou à Folha documento com o timbre da Petrobras que, segundo o assessor, comprova a correta prestação de contas
A Petrobras diz que a \"fundação comprovou a utilização dos recursos através de relatórios das atividades desenvolvidas e cumprimento de contrapartidas\": \"Foi realizada a modernização dos espaços físicos da Fundação José Sarney, a fim de promover uma melhor distribuição e adequação das inúmeras peças do acervo\".
Fernando Belfort, diretor da fundação, afirmou que a biblioteca e o museu ficam abertos diariamente. Não explicou o motivo de a biblioteca estar fechada na quinta. Raimundo Quintiliano Pereira Filho disse que é apenas voluntário na associação.
SARNEY NEGA ELO COM MUSEU, MAS USOU CARGO PARA AJUDÁ-LO
Folha de S. Paulo – 10.5.09
Apesar de afirmar em nota que \"não tem responsabilidade\" sobre a fundação que leva seu nome no Maranhão, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), pediu em 2005 para a advocacia da Casa contestar no Supremo Tribunal Federal uma lei estadual que contrariava seus interesses.
Lei estadual de 2005 determinou a reintegração do Convento das Mercês ao governo do Maranhão. No local funciona a Fundação José Sarney, um museu com o acervo do período em que ele foi presidente.
Ontem, para contestar reportagem do jornal \"O Estado de S. Paulo\", Sarney disse em nota que é apenas \"presidente de honra\" da fundação e que \"não participa\" nem tem \"responsabilidade\" sobre ela. Segundo o jornal, foram desviados recursos destinados pela Petrobras para a fundação.
A Petrobras repassou R$ 1,3 milhão à fundação pela Lei Rouanet, com projeto aprovado pelo Ministério da Cultura. Em bilhete enviado ao ministério, em 2005, Sarney pede agilização na tramitação do projeto de recuperação dos acervos.
Em um documento assinado pelo próprio Sarney em 21 de novembro de 2005, ele solicita à Mesa Diretora do Senado que ingresse \"o mais breve possível\" com uma Adin (ação direta de inconstitucionalidade) no STF contra lei aprovada no Maranhão que devolvia o prédio ao Estado. Pela lei, a fundação deveria deixar o local em 30 dias.
\"Diante da flagrante inconstitucionalidade da norma estadual recém-aprovada pela Assembleia Legislativa, não resta outra alternativa senão a propositura de ação direta de inconstitucionalidade perante o Supremo, com o objetivo de impedir a prática de ato totalmente contrário à ordem constitucional vigente no país\", escreveu Sarney. Procurado, ele não respondeu à reportagem.
A legislação garante à Mesa Diretora do Senado a prerrogativa de ingressar no Supremo com ações deste tipo. Mas, segundo a Folha apurou, essa foi a primeira e única vez em que o Senado contestou na mais alta Corte do país uma lei estadual.
Na época da Adin, em 2005, o Senado era presidido por Renan Calheiros (PMDB-AL), que assina a ação ao lado do então advogado-geral, Alberto Cascais. Renan é um dos principais aliados de Sarney.
A Folha apurou que Renan fez consulta informal aos membros da Mesa sobre o pedido e considerou que, embora o assunto não tivesse relação com o Senado, atender seria uma forma de prestigiar o ex-presidente da Casa. Ele não comentou o assunto ontem.
O atual advogado-geral do Senado, Luiz Fernando Bandeira, disse que \"a lei legitima a Mesa a ingressar com Adin\".
Sem a ajuda da Mesa Diretora, Sarney teria que ingressar com ação na Justiça de primeira instância, onde cabe recurso e o processo poderia se prolongar por anos. Um mês depois de o Senado entrar com a ação, o STF deu uma liminar que suspendeu a eficácia da lei maranhense e garantiu a permanência da fundação no prédio.
A Adin ainda não foi julgada no plenário do STF. Recentemente, a Procuradoria considerou a lei maranhense inconstitucional. Na época, o governador do Estado era José Reinaldo Tavares (PSB), que rompeu com Sarney.
Presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado, o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) diz que \"o assunto não era de interesse do Senado\".
No plenário do Senado, Sarney voltou a negar ligação com a entidade e disse que a prestação de contas já foi encaminhada e \"compete ao Tribunal de Contas, em qualquer irregularidade, a atribuição de julgar\".
FUNDAÇÃO REPASSOU VERBA AO CONTADOR DA FAMÍLIA
Folha S. Paulo – 10.7.09
A Fundação Sarney repassou R$ 40 mil destinados a um projeto cultural para a empresa de um contador que presta serviços para a família Sarney há pelo menos dez anos. Localizado pela Folha, ele não soube explicar que trabalho executou.
Os recursos são provenientes da Petrobras, que repassou R$ 1,3 milhão para a Fundação Sarney preservar o seu acervo.
Parte desse bolo foi destinado à MC Consultoria Empresarial Ltda. A empresa pertence a Marco Aurélio Bastos Cavalcanti, contador e advogado que trabalha para a TV Mirante, afiliada da \"Rede Globo\" em São Luís (MA), dos Sarney.
No ano de 2000, Cavalcanti assinou um documento da Junta Comercial do Maranhão como testemunha da alteração do capital social da TV Mirante, que passou a R$ 8,1 milhões, divididos em partes iguais pelos três filhos de José Sarney: Fernando Sarney, Roseana Sarney e Sarney Filho.
Por telefone, o contador confirmou ter sido contratado pela fundação, mas não conseguiu explicar para quê. \"Foi serviço de assessoria para fazer um projeto. Fiz o serviço, está lá.\" Questionado sobre que tipo de assessoria, disse: \"Assessoria para fazer o projeto, só isso\".
A Folha insistiu. Quis saber para que projeto Cavalcanti prestou assessoria: \"Foi um projeto lá da Fundação com a Petrobras (...) Assim de cabeça eu não vou me lembrar. Eu não posso me lembrar de tudo\".
Depois de obter o documento mostrando que ele foi testemunha da TV Mirante, a Folha tentou novo contato com o contador, mas ele não estava.
Sua mulher, Lucileide, confirmou que ele presta até hoje serviços para a emissora. \"[Ele presta serviço] quando precisa assim de uma consulta, para resolver tributação, negócio de despesa. Tipo uma consultoria mesmo para a empresa, onde pode melhorar, essas coisas.\"
A MC Consultoria não funciona no endereço informado à Receita. Mudou-se duas vezes, mas não atualizou os dados. Agora, está instalada em um escritório no bairro Calhau. Reportagem de \"O Estado de S. Paulo\" diz que a empresa é fantasma. O contador nega: \"Sou conhecido em São Luís. Minha empresa existe. A prova é que você está falando comigo\".
Em nota, a Fundação Sarney disse que a empresa está em \"pleno funcionamento\" e atende a diversas empresas de São Luís. Sobre os serviços prestados pela MC Consultoria, afirma que eles \"foram realizados conforme as cláusulas estabelecidas no contrato\".
A fundação também nega a afirmação de que essa e outras empresas que receberam recursos provenientes da Petrobras são fantasmas. Diz a entidade que elas têm endereço fixo e outros clientes.
A assessoria da Petrobras disse que sua responsabilidade no patrocínio era só comprovar se o nome da estatal era divulgado pela fundação na mídia ou em catálogos. Isso, segundo a companhia, foi cumprido.
Responsável pela prestação de contas do dinheiro repassado, o Ministério da Cultura afirmou que a fundação tem até o fim do mês para apresentar relatório final da aplicação do dinheiro e não comentará o caso até o julgamento do processo.
A Controladoria Geral da União poderá abrir auditoria para verificar a aplicação dos recursos pela fundação. Ontem, o ministro Jorge Hage pediu informações preliminares sobre o patrocínio ao colega da Cultura, Juca Ferreira.
POÇO SECO PODE LEVAR GOVERNO A REVER PLANOS PARA O PRÉ-SAL
Folha de S. Paulo – 10.7.09
Tida como um bilhete premiado tirado pelo Brasil e pela Petrobras, a descoberta do pré-sal da bacia de Santos sofreu um revés nesta semana com o anúncio do consórcio liderado pela Exxon de um poço seco, o primeiro onde não foi encontrado óleo na nova e ainda promissora província petrolífera.
Para especialistas, a notícia serviu para dar um \"choque de realidade\" tanto no governo como na Petrobras e levará certamente a um redesenho das propostas em análise para o novo marco regulatório do setor, que estava prestes a ser anunciado.
\"O furo seco mostrou que o risco do pré-sal não é zero, como apregoava o governo, que vendeu a ideia com estardalhaço de que as reservas serviriam para suprir todo o mundo de petróleo e quitar a dívida social do país. Agora, vimos que o pré-sal não é um bilhete premiado, mas também não é uma porcaria\", diz Adriano Pires, da consultoria CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura).
Até o insucesso de Guarini (área perfurada pela Exxon), o pré-sal era disparadamente a mais promissora região exploratória do mundo. É que havia sido encontrado óleo em todos os poços perfurados até então.
Na própria área de concessão de Guarani, o bloco BMS-22, o consórcio (que conta ainda com Amerada Hess, 40%, e Petrobras, 20%) obteve sucesso e descobriu a reserva de Azulão.
Cassino
Para David Zylbersztajn, ex-diretor-geral da ANP, o \"anormal\" era a taxa de sucesso de 100% do pré-sal, e não o poço seco, algo comum. O geólogo Giuseppe Bacoccoli, pesquisador da Coppe-UFRJ, diz que o índice na bacia de Santos é de 20%. Ou seja, em 80% dos poços não é achado petróleo em volumes comerciais.
\"Furar e não dar nada é a vida do setor, que é um cassino, no qual o crupiê é a natureza. O pré-sal era algo espantoso, mas se viu que nem tanto como se pensava. Mas ainda é uma reserva muito importante, muito promissora\", diz Zylbersztajn.
Na visão de Pires, o governo fez \"um estardalhaço\" em torno das descobertas do pré-sal e o mercado embarcou.
Ele cita as previsões \"astronômicas\" de bancos de reservas de 80 bilhões de barris e de investimentos de US$ 1 trilhão. Agora, bancos já dizem que o consórcio reduzirá investimentos de US$ 17 bilhões para US$ 5 bilhões diante do fracasso de Guarani.
Para os especialistas, porém, o setor volta à realidade, mas não deve colocar o pé no freio. \"Se o governo fizer um leilão de áreas do pré-sal, será um sucesso\", aposta Zylbersztajn.
Os três dizem, porém, que o poço seco -que chegou a custar US$ 200 milhões, segundo estimativas do setor- coloca o debate em torno do novo modelo num novo patamar. Para eles, não cabe mais nem a criação de uma nova estatal -que iria administrar um volume menor de reservas diante das novas condições- e nem o novo regime de partilha de produção.
\"O argumento do governo era que o risco era zero, mas esse argumento não existe mais\", afirma Bacoccoli.
Somente em perfurações, a Petrobras investiu US$ 2 bilhões e conseguiu realizar nove descobertas no pré-sal. Achou óleo em todos os poços.
A estatal pretende investir US$ 111 bilhões até 2020 no pré-sal, de onde extrairá 1,8 bilhão de barris. Existem estudos para a instalação de 10 plataformas na região.
BANDEIRA BRASILEIRA
Folha de S. Paulo – 10.7.09
MONICA BERGAMO
A Petrobras já se prepara para contestar a representação que a Prefeitura de São Paulo e ONGs apresentaram à OEA (Organização dos Estados Americanos) acusando o governo de desrespeitar os direitos humanos ao adiar a adoção do diesel S-50, menos poluente, no país. Uma das argumentações possíveis é a de que um ente do Estado (a prefeitura) não pode processar outro (o governo federal).
O diretor de abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, diz que a empresa \"fala, fala, mas infelizmente algumas pessoas fazem questão de não entender\". Ele sustenta que, embora as instalações para a produção do S-50 não tenham ficado prontas neste ano, como era previsto, a estatal sempre se dispôs a importar o diesel para abastecer o mercado.
Com o acordo feito com o Ministério Público e fabricantes de veículos, as 22 unidades de produção estarão prontas em 2012 e o S-50 será disponibilizado a todo o país. Enquanto isso, o diesel é importado para abastecer parte da frota de algumas capitais.
ESTATAL DESMENTE VERSÃO DIVULGADA POR FUNDAÇÃO
O Estado de S. Paulo – 10.7.09
Na tentativa de se defender das suspeitas de irregularidades na fundação que leva o seu nome, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), apresentou uma versão diferente da divulgada pela própria entidade. E a Petrobrás acabou desmentindo a Fundação José Sarney.
Na tarde de ontem, a fundação divulgou nota afirmando que enviou à Petrobrás a \"quitação das contas\" do projeto cultural de digitalização do museu de Sarney em São Luís. No plenário, o presidente do Senado deu outra versão aos senadores. Informou que esse material foi entregue ao Ministério da Cultura, pasta que aprovou o projeto com o patrocínio da Petrobrás. Sua assessoria, porém, chegou a manter a versão da fundação.
Depois de divulgar nota em que diz não ter responsabilidade sobre as empresas fantasmas contratadas pela entidade de Sarney para executar o projeto, a Petrobrás manifestou-se novamente, desta vez para corrigir a fundação e explicar que não teve acesso à prestação de contas. A estatal esclareceu que \"não dá quitação às contas e sim atesta o pagamento dos valores contratados\". O Ministério da Cultura confirmou que essa análise está em andamento na própria pasta.
Documentos da Fundação José Sarney mostram que o senador acompanha com lupa os trabalhos de sua entidade, inclusive o projeto patrocinado pela Petrobrás que repassou dinheiro a empresas fantasmas e de sua própria família. O estatuto da entidade diz que Sarney é \"presidente vitalício\" da fundação.
Ele apenas delegou ao amigo José Carlos Sousa e Silva poderes para \"exercer\" a presidência em sua ausência. Silva acaba de ser indicado pelo senador a uma vaga de juiz no Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão.
O Estado descobriu que a relação entre a fundação e o mundo do petróleo é muito maior. Um genro de José Carlos Silva - que assina a prestação de contas do suspeito convênio com a Petrobrás - foi nomeado em novembro para ser diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP), a convite do ministro Edison Lobão (Minas Energia), aliado da família Sarney.
O assessor de imprensa de Lobão, Antônio Carlos Lima, o \"Pipoca\", é do conselho fiscal da Fundação José Sarney. Uma empresa de seu irmão, a Clara Comunicação, recebeu R$ 103 mil do recurso da Petrobrás repassado ao museu do senador.
Ontem, Sarney tentou desvincular-se da gestão da entidade que leva o seu nome depois de o Estado revelar irregularidades na prestação de contas da verba recebida da Petrobrás. Segundo a assessoria do senador, Sarney \"não participa de sua administração, nem tem responsabilidade sobre ela\".
Não foi bem o que ocorreu. Além da carta enviada por ele ao Ministério da Cultura pedindo agilidade no processo, o senador aparece num relatório de atividades do projeto.
O texto indica que Sarney dava a última palavra no andamento dos trabalhos. "À tarde, a designer Zélia, da Clara Comunicações, fez uma exposição do cartaz que está em andamento, assim como do folder. Ficou acertado que este material iria ser enviado para o senador José Sarney".